31.5.10

Depois de ser

digo da boca já viajada
que irá em breve ainda que demore
o tempo não se conta pra quem vive de poesia e conto
e antes que se despeça de mim, terás tido o meu todo
dormido com meu cheiro e provado do meu calor
e quando assim quiser, a estrada
estar nela como despedida
me terás, não no que fui presente
mas na saudade cultivada
antes da visita da boca viajada

28.5.10

Inesperado


Às vezes me sinto menino
Me sento no precipício da vida
Me mimo,
Choro no cume da mentira
É lágrima que escorre na brecha!
Entre o coração e a alma
encontra-se a folga dos olhos.
Escorrega.
Pinta e enfeita a dor.
Acaricia a pele fina
É água,
chuva,
é carinho de pai, mãe.
É de Deus a mão
torneia meus lábios
Tem gosto de solidão
Ela cai sozinha por sobre meu queixo
Segue a ribanceira da minha face,
enquanto me cerco de montanhas
É ela quem se atira primeiro
Do penhasco de minha moradia
Enquanto permaneço sentado
À beira de tudo que crio
Meu mundo de argila
barro, pedra e areia
É quase tudo fantasia
E eu aqui molhando os olhos
Esperando pelo inesperado.

24.5.10

Desfiladeiro

Será teu silêncio o escudo que tanto profana?

Será teu escudo, tua defesa, que revela tua voz
silenciada por teus medos?!

Será então, o teu temor à tua voz, e o teu
tremor a tua forma de sentir-me?

Não peques em esconder-se, peques por ousar.

Há mais aventura no erro que na captura muda,
sem o desfiladeiro empueirado do teu corpo
em queda livre!

19.5.10

Depois de morto

Qualquer dia vou vestir a minha alma de um extremista qualquer
lhe colocar uma cintura de bombas, engatilhada pelo meu dedo de carne e osso
e mandar ela pro inferno, assim bem suicida
e quando não quiser mais, além de mim, levarei tudo aos ares

Isso mesmo, minha alma explodirei!

E depois, juntados os meus cacos, me recolher
só pra saber se depois de morto alguma coisa aprenderei.

4.5.10

Copo de vidro

Quando sou eu...
Sou tão mesmisse, que quando me rouba é como uma criança,
Que pega um copo de vidro e o taca no chão e ri,
Por que, agora, de um ela fez diversos

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Quando me vejo escrito
Sou mesmisse, essa repetição que já conheço
Quando me roubas, me recrias, me inventas
Sorrio, ao encontrar-me
Como uma criança, ao lançar um copo ao chão
Não por quebrá-lo, mas por fazê-lo em muitos

Há outro(a)

E seu beijo era doce
sua loucura, era meu torpor
era seu braço meu acalanto
seu nome meu encanto

sua boca então fez-se faca
arma branca sim
enterrando-se em outra que não minha
cortara o peito meu

esse braço que me abraça
é meu sagrado manto
castiga-me com as chicotadas dos dedos leves
e me arranca o sono com a textura
do lodo, sujo, de outro corpo

e quando me tomas, meu corpo
que não pertence a mim e nem o seu que é meu
somam-se, há um impulso
esse de carne, parece haver sangue e dor

e bebo esse fél na fonte de sua miséria
e tudo o que tenho é o resto do que não querem
meu exílio é ser sombra de mim,
na pena de mim mesmo

morro sempre que volto a ser seu
e hoje, encarno um corpo novo
o que me visita, e me encanta
por não ser você,

enquanto visto-me de algoz
na armadura feita por suas vãs atitudes
e assim, tomo o corpo que se entrega
e dormimos como cumplices

e te verei à noite, para comemorarmos
a morte de nós mesmos.